sábado, novembro 10, 2007

O Castelo de Coimbra

Muitas das principais localidades do nosso país tiveram, sobretudo no período medieval, “direito” ao seu castelo. Relíquia majestosa de um tempo de batalhas, com avanços e recuos territoriais, onde era essencial defender a todo o custo o espaço físico que já, ou ainda, se possuía, tanto do ponto de vista real como do simbólico, para além de ser uma afirmação de autoridade dos governantes sobre os seus súbditos. A cidade de Coimbra não fugiu à regra. Mas, decerto, muitos perguntarão hoje, onde estará esse castelo? A verdade é que o castelo de Coimbra já não existe. Localizava-se na zona mais elevada da cidade, como aconteceu com os outros. Mais concretamente, situava-se no então cume da Alta de Coimbra, vários metros adiante do Paço Real, onde se veio a instalar a Universidade. Aliás, a vasta colina encimada pelo Pátio da Universidade, compreendia a cidade muralhada, da qual ainda se conservam alguns vestígios aqui e ali. O castelo propriamente dito, com o seu núcleo de torres, ficava mais ou menos na área onde atualmente se localiza o perímetro da Praça D. Dinis. Esta construção datava ainda dos tempos da Reconquista Cristã, mais concretamente desde o reinado de D. Afonso Henriques. Era igualmente a mais viva recordação de um tempo em que Coimbra foi capital do então novo Reino de Portugal, antes de perder este estatuto para Lisboa. Com o passar do tempo, tanto a muralha como o castelo foram sofrendo, aqui e ali, alguns acrescentos e reparações, em virtude, não só do crescimento da população que aí se albergava, bem como de episódicos reforços da sua capacidade defensiva. Por exemplo, sabe-se que o rei D. Sancho I construiu uma larga torre, próxima da já existente Torre de Menagem, que ficaria conhecida como a Torre Quinaria ou Torre de Hércules, a qual seria utilizada em diversos períodos como prisão. Devido à consequente degradação das muralhas, estas seriam sujeitas a novos reforços durante o reinado de D. Fernando. Como consequência da pressão urbanística, devido, nomeadamente, à construção de novos edifícios, seja adossados às muralhas, seja implicando demolições em diversos pontos, tudo isto auxiliado pelo inevitável processo de ruína das mesmas, a estrutura antes defensiva, começou a descaracterizar-se. Isto começou-se, sobretudo, a notar a partir do século XVI, coincidindo com a construção de parte substancial dos grandes colégios das ordens religiosas. Por outro lado, com a inexistência de novas batalhas nesta região, a cidade havia-se começado a expandir para “fora de portas”, secundarizando por completo a função dos muros defensivos. O próprio castelo foi apresentando crescentes sinais de ruína, para além de ser alvo do roubo de pedras, nomeadamente na Torre de Hércules. Apesar da degradação e da gradual demolição de algumas paredes circundantes, o núcleo essencial do castelo, onde se destacavam as já referidas Torre de Menagem e Torre Quinaria ou de Hércules, foi-se mantendo. Tudo mudou com a chegada da Reforma Pombalina a Coimbra, na década de 1770. Apesar de, para além de outros aspectos, esta ter sido fundamental na modernização dos espaços destinados ao ensino, construindo novos edifícios e beneficiando outros, não o acabou por ser para o seu castelo. Quando se projetou a construção de um moderno e bem equipado observatório astronómico, segundo os moldes mais inovadores de então, foi precisamente escolhida a área ocupada pelo castelo medieval. Adicionalmente, devido ao facto de este espaço estar rodeado por vários edifícios, convinha que fosse alto e tivesse vários pisos. Projetado, juntamente com outros, no ano de 1772, as suas obras iniciaram-se em 1773. No entanto, acabou por se revelar um completo fracasso. Para começar, todo o custo da obra revelou-se, de facto, astronómico. Apesar dos sinais de ruína, a demolição do castelo, nomeadamente das suas robustas torres, estava-se a revelar muito demorada e difícil, para além de francamente dispendiosa. Uma das medidas para tentar contornar este ónus, foi não demolir a parte de baixo da Torre de Menagem, de forma quadrangular, integrando-a no interior da obra. Por outro lado, descobriu-se, muito tardiamente que, afinal, a sua localização não seria a mais indicada. O futuro Observatório Astronómico tornar-se-ia, muito provavelmente, num “elefante branco”. Desta forma, as obras foram suspensas em 1775, quando só estavam erguidas as paredes do andar térreo. Na sequência disto, optou-se por uma solução menos dispendiosa e de conclusão mais célere, que ficou localizada ao fundo do Pátio da Universidade, entre o Colégio de S. Pedro e a Biblioteca Joanina. Aí ficou o novo Observatório Astronómico, até ser demolido em 1951. Quanto ao resultado da obra inacabada que implicou o sacrifício do velho castelo de Coimbra, este permaneceria assim por mais ou menos uma centúria, à ruína e ao abandono. Foi então que, na sequência da concretização, na segunda metade do século XIX, de diversos projectos de reforma dos Hospitais da Universidade de Coimbra, que o Observatório inacabado foi destinado a lavandaria e rouparia hospitalar. Paralelamente, foi rearranjado um terreno que lhe era adjacente, para a instalação de estendais de secagem de roupa. Até à concretização das obras da Cidade Universitária, que implicaram o arrasamento de parte substancial da Velha Alta de Coimbra, permaneceriam aqui e ali, alguns vestígios do castelo e paredes circundantes, como a seteira que se pode observar na fotografia de cima. Por volta de 1944, o edifício rectangular da lavandaria é demolido, expondo, uma única vez, o que restava da torre afonsina de Menagem, visível na fotografia de baixo. Logo de seguida seriam efetuadas novas terraplanagens e escavações que ditariam o desaparecimento definitivo do Castelo de Coimbra.

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