É natural que alguns compradores incautos, interessados em comprar mais uma colectânea de Rod Stewart, se sintam algo defraudados com a selecção de canções que se lhes apresenta neste disco. Outros, pelo contrário, abertos a novas descobertas e pequenas surpresas, ficarão algo agradados pelas verdadeiras raridades que este disco aloja.
Isto acontece porque, na verdade, esta pequena colectânea de apenas 10 canções refere-se sobretudo a um grupo musical que, como muitos ao longo da História, lhe viu fugir a luz rigidamente selecta do sucesso e se viu enquadrado numa obscuridade, e consequente esquecimento, só muito raramente quebrada com ocasionais edições discográficas limitadas para coleccionadores e, nem sempre, nas melhores condições sonoras.
O grupo em questão respondia pelo nome de Python Lee Jackson. Quase ninguém, ainda para mais em terras portuguesas, terá ouvido falar em tal grupo musical e saberá, sequer, a sua localização espacio-temporal. Mesmo no panorama dominante da música anglo-americana, tal grupo surgirá quase como uma breve nota de fundo de página, quase ignorada mas incontornável, precisamente graças à acidental presença de Rod Stewart.
Na verdade, o veterano artista, que será a razão para muitos comprarem esta colectânea, é simplesmente um convidado, pois nunca foi membro dos Python Lee Jackson. Aliás, neste breve universo de 10 canções, Rod Stewart surge como vocalista em apenas 3, mais concretamente nos temas "The Blues", "Doing Fine (Cloud Nine)" e, claro está, no genial "In A Broken Dream". Nos outros 7 temas, incluindo o que dá o título a esta colectânea ("Turn The Music Down"), a parte vocal fica a cargo de um certo Dave Bentley, teclista, líder e principal compositor dos Python Lee Jackson. (em baixo) O disco é completamente desprovido de qualquer detalhe informativo, salvo nos (breves) créditos autorais dos temas seleccionados.
Como entra aqui Rod Stewart, numa banda a que ele nem sequer pertencia? A história por trás disto não é completamente clara, mas uns breves dados adicionais poderão fazer alguma luz sobre este episódio curioso.A banda Python Lee Jackson (em cima, em 1966) era originária da Austrália, mais concretamente, de Sydney. Terá iniciado as suas actividades em 1965, sob o breve nome de "Blues Breakers" em cuja formação já ponteava o elemento fundamental Dave Bentley. Era essencialmente um grupo que actuava ao vivo e chegaria a conquistar alguma popularidade em terras australianas. O seu estilo musical misturava rock, pop e, como marca distintiva, blues, que, na segunda metade dos anos 60, era um género que conquistava muitos adeptos e popularidade no panorama da música anglofona. Na Inglaterra, por exemplo, abundavam grupos de jovens cantores brancos que idolatravam a música negra e tentavam emular os seus (estes veteranos) cantores de blues. Os Yardbirds, (em baixo) com Eric Clapton e Keith Relf em destaque, eram um perfeito e bem sucedido exemplo destes numerosos bluesmen. O cantor Rod Stewart (em baixo), em início de carreira, também tentava singrar, com muito empenho e sacrifício, neste mundo peculiar do blues. A sua fama como um cantor e performer de excepção crescia a olhos vistos por entre a comunidade musical britânica, mas o seu verdadeiro reconhecimento público ainda estava para vir.
Terá sido esta popularidade verdadeiramente institucional do "Rhythm 'n Blues" nas ilhas britânicas, que terá levado Dave Bentley a regressar à sua terra natal, no ano de 1967, quando a sua banda original Python Lee Jackson, se encontrava num impasse sem futuro, ao fim de quase dois anos de actuações ao vivo. A formação original dissolveu-se por esta altura.
Por coincidência, nesse mesmo ano de 1967, os Bee Gees (em cima), vindos igualmente da Austrália para a Inglaterra, iniciavam a sua longa carreira de sucessos internacionais, mas a história destes seguirá outros rumos que não interessa aqui referir.
Chegado a Inglaterra, Dave Bentley reúne de imediato os elementos de uma nova formação dos Python Lee Jackson, onde se incluía, entre outros, um ex-membro dos Easybeats, outra banda originária da Austrália e também, por essa altura, instalada em Londres desde 1966.
A carreira dos Python em terras britânicas, acabará por se desenrolar nos mesmos moldes da sua anterior versão australiana, com sucessivas actuações ao vivo, incluindo como "grupo de suporte" em espectáculos de outros artistas mais famosos, entre eles Georgie Fame, e actuações em bares londrinos.
Com o seu estilo musical onde predominava o blues, os Python Lee Jackson eram mais um entre muitos no muito competitivo mundo musical anglo-americano e, sem contrato discográfico, o seu destino mais provavel seria o fraco sucesso e rápido esquecimento nesse panorama musical da segunda metade da década de 60, onde tudo estava a evoluir e a passar de moda com uma rapidez alucinante.
A sorte de Dave Bentley e a sua banda pareceu tomar um rumo mais favorável, em 1968, quando o mítico D.J. John Peel (em cima) lhes reconhece grande potencial e qualidade (como acontecerá com tantos outros artistas ao longo da sua vida) e decide assinar-lhes um contrato numa sua então recém-fundada editora independente ("Dandelion Label"). A possibilidade de poder gravar um disco, nem que fosse um simples single, era o sonho de qualquer grupo musical que se prezasse e de, pelo menos, a sua existência poder ficar registada para a posteridade. Muitos, nem isso conseguiriam...
Conseguido o tão almejado contrato, havia que decidir o que gravar, se teria que ser composto "de raíz" por alguém da banda ou exterior a ela, sem esquecer se teria algum potencial comercial. Para uma banda como os Python Lee Jackson, cujo repertório ao vivo assentava muito na interpretação de temas de autoria alheia, a tarefa era, ao mesmo tempo, estimulante e hercúlea. Dave Bentley, tendo já composto alguns temas préviamente, decide tomar para si a função quer de compositor principal (não excluindo alguma participação adicional de um ou mais membros da sua banda), quer de responsável pela escolha dos temas de autoria alheia.
Eventualmente, o repertório que Dave Bentley tinha disponível no momento da assinatura do contrato com John Peel, num panorama musical em permanente transformação, correria o risco de soar algo "fora de moda" ou apenas "clássico", podendo não cativar o potencial público ouvinte (e comprador).
Havia por isso que compor, quanto antes, um novo tema que, apesar de ser original, não poderia estar desenquadrado do panorama musical então em voga. Com grande mestria, Dave Bentley compõe um novo tema a que John Peel, muito acertadamente, reconhece um enorme potencial. O seu título era "In A Broken Dream". Todavia, colocou-se a Dave Bentley um problema quase incontornável: a canção era da sua autoria, mas a sua voz e forma de cantar não lhe pareciam adequadas para o resultado pretendido. O tema era muito forte e exigia uma voz com certas peculiaridades. Dave Bentley tinha em mente uma voz que tivesse o potencial e o "arranque" no género de certos cantores como Joe Cocker e Stevie Winwood.
John Peel tem então a genial ideia de entrar em contacto com seu velho amigo Rod Stewart. Havia anos que Rod Stewart vinha conquistando um importante lugar entre os vocalistas da sua geração. A sua versatilidade em interpretar os mais diversos estilos, para além do blues, tinha atingido uma notável desenvoltura nesse Outono de 1968. De referir que, por essa altura, Rod Stewart era o vocalista de uma importante banda de rock-blues, denominada Jeff Beck Group.
Esta banda, constituida à volta do genial guitarrista Jeff Beck, vinha também adquirindo grande popularidade nos Estados Unidos. O próprio Rod Stewart, graças a uma série de digressões bem sucedidas, vinha adquirindo uma popularidade crescente junto do grande público, acabando por eclipsar todos os outros que com ele actuavam. Terá sido este curto mas crucial período no Jeff Beck Group, ao lado de Ronnie Wood (desde 1975 nos Rolling Stones), a plataforma de arranque fundamental para a sua nova carreira a solo, a partir do ano seguinte (1969). De referir que, excluindo a fase do Jeff Beck Group, a carreira de Stewart anterior a 1969, é algo enigmática, com os registos sonoros nem sempre organizados com o devido cuidado e rigor e a documentação informativa anexa muito pouco clara e com algumas contradições. Um período de formação que, todavia, convém conhecer. Em duas postagens anteriores neste blog, faço uma breve referência a essa fase.
A sua breve relação com os Python Lee Jackson, constitui mais uma faceta dessa fase algo obscura.
Regressemos a esse proverbial telefonema de John Peel a Rod Stewart durante o Outono de 1968. Nesse período, Stewart encontrava-se "vinculado" como vocalista principal ao Jeff Beck Group (em baixo), cujo primeiro LP "Truth" havia sido há pouco lançado, e os espectáculos e digressões se estavam a tornar muito frequentes, para além de algumas mudanças de pessoal.
Pode-se afirmar que a resposta afirmativa de Rod Stewart ao telefonema de John Peel foi muito oportuna, pois a banda Python Lee Jackson, já tinha agendada no estúdio a sessão de gravação destinada ao seu novo tema e o problema da "inadequação vocal" mantinha-se em aberto. Rod Stewart aceitou fazer um verdadeiro favor ao seu amigo de longa data e, por extensão, a Dave Bentley e à sua banda, pois tinha diversas obrigações para com a sua banda Jeff Beck Group. Podia, com toda a legitimidade, não ter aceite o pedido de John Peel, alegando razões contratuais, e a história seria outra...
Combinada a hora e o local, Rod Stewart aparece no estúdio para a sessão de gravação do tema "In A Broken Dream". Após conversar com Dave Bentley e se inteirar das devidas instruções, Rod Stewart e os Python Lee Jackson decidem começar por gravar a "demo" (primeira versão de demonstração básica) da canção. A intenção original deste pequeno "favor" de Stewart, era fazer um "guide vocal", a partir do qual o vocalista Dave Bentley e o resto da banda, construiriam a master final do tema.
O que se seguiu, foi um dos momentos mais inesquecíveis da História da Música Pop. Sem qualquer preparação prévia, sendo simplesmente fiel ao seu estilo habitual de interpretação, Rod Stewart canta, com toda a naturalidade, sem dificuldade e de uma vez o tema "In A Broken Dream". John Peel, Dave Bentley e a sua banda, ao acabar a gravação "demo", perceberam ter assistido a algo memorável e irrepetível. A "demo" tornou-se a "master" final, caso raro numa gravação de estúdio. Estavam todos satisfeitos com o resultado e, desta forma, não se gravou mais nenhum "take" de "In a Broken Dream".
Python Lee Jackson (feat. Rod Stewart) - In A Broken Dream (1968). Lançado depois em 1971.
A gravação do tema para o qual se havia agendado a sessão acabou por durar muito menos tempo do que o previsto. O que significou que sobrou um "tempo livre" não previsto. Desta forma, aproveitando a presença bem oportuna de Rod Stewart, a banda decide gravar, à experiência, mais dois temas, ambos de autoria alheia. Stewart não se fez de rogado e, por mais uns minutos, decidiu levar avante a sua missão de "cantor convidado" dos Python Lee Jackson, com muito bons resultados. Os temas eram o muito doloroso "The Blues" e o dinâmico e descontraído "Doing Fine (Cloud Nine)".
Python Lee Jackson (feat. Rod Stewart) - "The Blues" (1968).
Python Lee Jackson (feat. Rod Stewart) - "Doing Fine (Cloud Nine)" (1968).
No final daquela memorável sessão de gravação, chegou a ponderar-se a ideia de Rod Stewart ficar como vocalista adicional dos Python Lee Jackson. Acontece que, como já foi referido atrás, Stewart, nesse período, estava contratualmente obrigado ao Jeff Beck Group, havia todo um conjunto de espectáculos e digressões a cumprir, sem esquecer a ideia de, dentro de meses se proceder à gravação de um segundo LP (do Jeff Beck Group). Mais concretamente, se o single fosse lançado e resultasse num sucesso comercial, levando a que se solicitasse a realização de espectáculos e digressões (sempre essenciais!), Rod Stewart, elemento-chave, pelo menos nesse tema, não poderia participar.
Na sequência destes receios, John Peel decide cancelar o lançamento do tema, incluindo os outros dois onde Rod Stewart participava. Ficariam inéditos até ao começo da década de 70.
Dave Bentley e os Python Lee Jackson (em cima), durante o breve tempo em que estiveram na editora de John Peel, chegaram a compor e a gravar toda uma série de temas que acabaram por não ser lançados na altura inicialmente prevista. O grupo deixou a editora de John Peel durante a primeira metade de 1969.
No final de 1969, o produtor Miki Dallon, que havia lançado a editora independente "Young Blood", decide adquirir todas as gravações relacionadas com os Python Lee Jackson, com a intenção de eventualmente as editar. Lançou-as no mercado por volta de 1970/1971, na sua já referida editora, todavia, sem qualquer sucesso.
Vários meses mais tarde, aproveitando o agora indiscutível sucesso de Rod Stewart, Miki Dallon é perseverante e decide dar mais uma oportunidade ao tema "In A Broken Dream", dando, desta vez, um merecido destaque à presença do referido cantor, sem esquecer de referir o nome da banda que o havia "convidado". Desta vez o resultado foi a sua rápida ascensão aos primeiros lugares das tabelas de vendas, pelo menos, dos dois lados do Atlântico. Por apenas uma vez na vida, Dave Bentley, ainda que fora de época, tem a oportunidade de sentir o sabor do sucesso, dado que, saliente-se uma vez mais, "In A Broken Dream" é da sua exclusiva autoria. Nessa altura, em 1972, Dave Bentley tinha regressado à Austrália e os Python Lee Jackson eram uma coisa enterrada no passado. Aliás, o seu nome só é resgatado do esquecimento graças a Rod Stewart, afinal um mero "cantor convidado", que uma feliz decisão no momento certo de John Peel (em baixo), permitiu salvar uma sessão de gravação, que se julgava ser mais difícil do que acabou por acontecer.
As outras gravações ficariam à espera de melhores dias...
Desde então e, sobretudo com o advento do CD, essas gravações têm surgido dispersas e, muitas vezes sem o mínimo critério, nas mais variadas colectâneas. A colectânea "Turn The Music Down" é um exemplo acabado dessas colectâneas, onde se recorre a um estratagema de Marketing (a presença de Rod Stewart, neste caso), para se conseguir vender temas que, por si só não seriam vendáveis. Todavia, os 3 temas que Stewart interpreta nesta colectânea, como "cantor convidado", por si só, justificam muito a compra não só desta colectânea, como de qualquer outra onde eles surjam. Isto porque, entretanto, adquiriram o estatuto de verdadeiras raridades e são, devido às notórias diferenças entre si, demonstrativos da já conhecida versatilidade de Rod Stewart em se mover dentro dos mais diversos géneros musicais. Os restantes 7 temas não destoam dos outros 3 e permitem dar a conhecer um pouco da carreira do grupo Python Lee Jackson, que também é extremamente difícil de encontrar.
Apesar de esta colectânea já ter sido lançada algures nos anos 90, foram acabando por surgir, aqui e ali, outras mais recentes, exactamente com as mesmas músicas e qualidade sonora idêntica ou quase idêntica. Nas ditas zonas de "saldos e promoções" das grandes superfícies é provável que se encontre alguma coisa deste género.
Olho atento e paciência é tudo o que é preciso para se encontrar o que se realmente procura em qualquer aglomerado de discos, onde não pareça haver nada onde valha a pena investir tempo e dinheiro.
Cabe ao potencial comprador decidir se está perante uma fraude ou simplesmente uma oportunidade única de adquirir o que (já) não existe noutros lugares.
Já há muitos anos, têm aparecido, por entre o vasto mercado de edições em CD de baixo preço, diversas colectâneas de Rod Stewart que não mais terão contribuido do que para lançar alguma confusão entre quem pretende ter um conhecimento mais profundo da carreira deste artista. Não é que elas sejam desinteressantes - aliás os erros que dentro delas surgem constituem alguns dos mais cómicos episódios do mercado discográfico actual e, por outro lado, poderão ser reveladores de algumas situações não tão pouco frequentes como se julgue.
Todas estas colectâneas têm uma apresentação chamativa ao mostrarem uma fotografia inequívoca de Rod Stewart no seu melhor, mas que não corresponde em nada à época em que ele terá gravado as versões originais de muitos dos temas que aí surgem. Pode-se usar como paradigma a colectânea referida em baixo, dado que quase todas as outras pertencentes ao universo "low-price" incluirão os mesmos temas ou até excluem alguns.
O essencial dos temas aqui incluidos, provém de uma outra colectânea de baixo custo, lançada por volta de 1976, "A Shot Of Rythm And Blues", quando Rod Stewart já era uma figura consagrada mundialmente e, contra a qual, na altura, ele se terá insurgido. Estes temas haviam resultado de algumas sessões de gravação, decorridas no Verão de 1964, após Stewart ter assinado um contrato com a Decca Records e com o intuito de gravar o seu primeiro single a solo - "Good Morning Little Schoolgirl"/"I'm Gonna Move To The Outskirts Of Town". De referir que a colectânea acima visível, não inclui este seu primeiro single. Com a óbvia excepção dos dois temas incluídos no single, todos os outros ficariam inéditos até 1976, quando surgiu a referida colectânea nos Estados Unidos. Os temas seriam sujeitos a um verdadeiro tratamento de choque, denominado "reforço instrumental", de forma a dar-lhes um som mais "moderno" e adquirir uma sonoridade estereofónica, visto que na sua versão de 1964, só existiam em “mono” e continham apenas um “naipe” básico de músicos.
Neste vídeo acima, encontram-se as demos de 1964 a que se faz aqui referência, juntamente com os singles "The Day Will Come" de 1965, "Shake" de 1966 e a versão experimental de "Little Misunderstood" gravada por volta de 1967-1968. Todos os temas encontram-se com o seu som original. Os vídeos seguintes permitem fazer uma melhor comparação entre as versões originais e aquelas onde houve as alterações referidas.
Rod Stewart - "Bright Lights, Big City" (1964 - 1976). Este é um exemplo das referidas "demos" gravadas em 1964, aqui já com o acrescento instrumental e som stéreo para o seu lançamento em 1976, inicialmente contra a vontade de Rod Stewart. A versão original tem um som muito mais simplificado e, por isso, genuíno.
Desta forma, à revelia de quem os havia concebido e interpretado, entre outros aspectos, são gravados “por cima” novos instrumentos adicionais, reforçado o som da bateria e, inexplicavelmente, truncado o início instrumental de alguns dos temas. Esta “revisitação” de um material que se poderia considerar sem utilidade para todo o sempre, poder-lhe-á ter dado uma nova vida e actualidade, mas, segundo muitos críticos, desvirtuou-os completamente.
Para além dos remisturados temas inéditos de 1964, esta colectânia inclui na integra os temas dos dois outros singles gravados a solo: o primeiro, "The Day Will Come"/"Why Does It Go On", editado em Novembro de 1965 e o segundo, "Shake/I Just Got Some", editado em Abril de 1966.
Rod Stewart - "The Day Will Come" (1965). Neste exemplo, em cima, ouve-se a versão original de 1965. Em baixo, é o mesmo tema, mas com o tal referido "tratamento" instrumental e sonoro para o seu re-lançamento em 1976.
Rod Stewart - Why Does It Go On (1965). Rod Stewart - Why Does It Go On (1965-1976).
Rod Stewart - "I Just Got Some" (1966).
Rod Stewart - "I Just Got Some" (1966-1976).
Nenhum deles teve êxito na época da sua edição original. Na colectânea acima referida, surgem sujeitos ao mesmo tratamento criticável de "reforço instrumental" e "estéreofonização", de forma a iludir a sua "idade" verdadeira. Durante este período de 1965/1966, Rod Stewart integrou também, ao lado de Long John Baldry, Julie Driscoll, Brian Auger e outros, um grupo de blues denominado "TheSteampacket". Desta breve aventura, são seleccionados dois temas, ambos covers, de dois clássicos "Can I Get A Witness" e "Baby Take Me". Estes também foram sujeitos ao já referido "tratamento de choque" da remistura.
Steampacket - Baby Take Me (1965).
Profundamente remisturado e sonoramente actualizado, surge também aqui o histórico dueto entre Rod Stewart e P.P. Arnold, proveniente de uma sessão de gravação produzida por Mick Jagger, no ano de 1967: "Come Home Baby".
Rod Stewart & P.P. Arnold - "Come Home Baby" (1967).
"Just A Little Misunderstood", é a demo do tema que seria o lado A do seu quarto single, editado, depois de alguns meses de adiamento, em Março de 1968: "Little Miss Understood/So Much To Say (So Little Time)". Esta versão experimental surge aqui, tal como muitos dos outros temas escolhidos, sem a parte instrumental do piano com que originalmente abria.
Rod Stewart - "Just A Little Misunderstood",a demo de "Little Miss Understood" (1967), tal como era originalmente.
A mesma demo anterior, mas sem a parte instrumental com que originalmente começava e com algumas alterações sonoras.
Por fim surgem vários temas "misteriosos", mas muito conhecidos de quem alguma vez experimentou comprar uma das muitas diversas colectâneas de baixo preço sobre Rod Stewart. São eles: "Sparky Rides", "Red Ballroom" e "Wide Eyed Girl On The Wall". São três exemplos de que um erro estúpido cometido uma única vez, poder-se-á, por vezes, perpetuar e multiplicar para todo o sempre. Por outro lado, estes erros poderão ter explicação numa outra situação que valerá referir mais adiante.
Rod Stewart - Sparky Rides.
The Small Faces - Wham Bam Thank You Mam (1968-1969).
The Small Faces - Donkey Rides, A Penny, A Glass (1968).
O tema "Sparky Rides", na verdade, é a canção "Wham Bam Thank You Mam", que surgiu no lado b do último single do grupo SmallFaces, lançado no começo de 1969, quando o seu líder Steve Marriott já tinha abandonado esta banda, para depois ir formar os Humble Pie com Peter Frampton. O tema surge aqui com som mais "potente" do que na sua edição originalmente lançada em 1969, graças, de novo, a uma forte dose do já referido tratamento de "reforço instrumental". O estranho título "Sparky Rides", deriva de uma má leitura do título abreviado de um outro tema também dos Small Faces: "Donkey Rides, A Penny, A Glass". Este último era o título do lado b do penúltimo single oficial dos Small Faces, lançado em finais de 1968.
Rod Stewart - "Red Ballroom".
O tema "Red Ballroom" é a repetição de um outro tema já também referido: "Come Home Baby". A única diferença reside no facto de esta "versão" ter sofrido um menor tratamento de "reforço instrumental" e, desta forma, apresentar um som muito mais próximo da versão originalmente gravada em 1967. O título "Red Ballroom", sem qualquer relação com a letra da canção, resulta também da má leitura do título de outro tema, também dos Small Faces, denominado "Red Balloon".
The Small Faces - Red Balloon (1968-1969).
Tratava-se de uma versão desta banda de um tema original de Tim Hardin (também autor de "Reason To Believe"), que havia ficado inédito quando os Small Faces se desfizeram no começo de 1969. O tema "Red Balloon" seria, meses mais tarde, recuperado no último, mas "póstumo", álbum duplo dos Small Faces "The Autumn Stone". Os dois temas atrás referidos surgem, nesta colectânea, sob a autoria errada de Rod Stewart.
O terceiro exemplo de tema "misterioso" é "Wide Eyed Girl On The Wall", tema dos SmallFaces e não de Rod Stewart. Aqui, a autoria está correcta, visto que o tema a que se refere é da autoria da dupla Steve Marriott e Ronnie Lane, ou seja, os dois principais compositores e elementos da banda Small Faces. Acontece que o tema que aqui surge sob este título, apesar de ter a mesma autoria, é de novo "Wham Bam Thank You Mam", embora numa versão de estúdio anterior à final editada e sem o tratamento de "reforço instrumental" que recebeu sob o título de "Sparky Rides". O verdadeiro "Wide Eyed Girl On The Wall" é um tema instrumental, provavelmente inacabado, também incluído no álbum final dos Small Faces, "The Autumn Stone".
The Small Faces - Wide Eyed Girl On The Wall (1968-1969).
A razão para estes erros sistemáticos, prender-se-á com todo um conjunto de circunstâncias ocorridas entre 1967 e 1970, que tinham um denominador comum : a Immediate Records.
Esta editora independente havia sido criada pelo famoso e antigo produtor e manager dos Rolling StonesAndrew Loog Oldham, em 1965. Por esta editora discográfica passaram muitos nomes da música dos anos 60, muitos deles hoje esquecidos, apesar de também se incluirem cantores e grupos que teriam sucesso, em especial logo depois de terem feito aqui a sua estreia. Todos aqueles que queiram ter um conhecimento melhor deste período da história da música, não poderão ignorar, pelo menos, as diversas colectâneas actualmente existentes no mercado, onde surge o grosso do temas, sobretudo em single, que foram gravados para a Immediate Records.
Esta editora acabaria por ser extinta em 1970, devido sobretudo a problemas financeiros provenientes de uma má gestão. Muitos dos seus artistas não veriam, pelo menos durante longos anos, a cor do dinheiro das suas "royalties". Entre estes estavam os Small Faces, cujos elementos sobreviventes só conseguiram ver esta situação injusta resolvida há muito pouco tempo atrás.
Rod Stewart, depois do fim da aventura falhada dos Shotgun Express, em Janeiro de 1967, decide investir de novo na sua carreira a solo e após um período de incerteza, decide assinar um contrato com a então muito reputada Immediate Records. Em paralelo, havia ingressado, como vocalista principal no "Jeff Beck Group", onde se começaria verdadeiramente a fazer notar junto do grande público. Para respeitar o contrato com a sua nova editora decide iniciar as gravações do já atrás referido single, "Little Miss Understood"/"So Much To Say (So Little Time)".
Rod Stewart - Little Miss Understood (1967-1968).
É numa destas sessões que surge a tal versão experimental do tema do lado A, que é utilizada em muitas colectâneas de baixo preço, quase sempre com a parte do inicio do piano (inexplicavelmente) truncada. Logo de seguida, desenrolar-se-ia a sessão de gravação produzida por Mick Jagger, de onde sairia o dueto com P.P. Arnold"Come Home Baby".
Acontece que nesse mesmo ano de 1967, os Small Faces, tendo rescindido o seu contrato com a Decca Records, também assinariam um novo contrato com a Immediate Records. Nesta editora gravariam, pelo menos, dois dos seus melhores álbuns, um deles o incontornável "Ogden's Nut Gone Flake" de 1968, para além de uma série de singles interessantes, antes de se dissolverem no começo de 1969.
The Small Faces - Lazy Sunday (1968).
The Small Faces - "Afterglow" e, sobretudo, "Long Agos And Worlds Apart" (1968).
Esta editora era um pequeno mundo, onde quase todos os seus protagonistas se conheciam uns aos outros, pelo menos de vista. Sendo Rod Stewart já uma figura peculiar e de elevado perfil e os Small Faces um dos mais famosos grupos da Immediate Records, não seria de espantar que os seus caminhos se cruzassem com frequência, tanto no estúdio como nas digressões. Por outro lado, as suas influências e referências musicais, nomeadamente a nível do blues, eram mais do que semelhantes.
Para além disto, a voz de então de Rod Stewart, apesar de inconfundível, tinha algumas sonoridades muito próximas com a de Steve Marriott (em cima), o líder e a voz principal dos Small Faces. Não admiraria que um ouvinte com menor cultura musical e pior ouvido (e nunca houve falta de gente assim), tendesse a confundi-los, por vezes. Por outro lado, o desgaste progressivo das fitas de gravação tenderia a apagar o brilho do som das suas vozes e, decerto, tornar mais fácil a confusão. Esta aparente similaridade entre as vozes de Stewart e Marriott, seria também um factor que incentivaria os outros três membros dos Small Faces a convidar o primeiro para lider do grupo que lhes sucederia, os Faces.
The Faces, com Rod Stewart (1º à esquerda) e Ronnie Wood (ao centro).
Acrescente-se a isto o facto de, após a dissolução dos Small Faces no começo de 1969, os laços de convívio e até de amizade entre os três membros restantes e a banda Jeff Beck Group, com Rod Stewart como vocalista principal, se haviam estreitado muito. Além disto, foi frequente, nesse período de 1969/1970, a sua participação conjunta em projectos musicais de curta duração, nomeadamente o há poucos anos descoberto Quiet Melon.
Quiet Melon - Engine 4444 (1969). Esta breve formação incluía Rod Stewart, Ronnie Lane, Ian McLagan, Kenny Jones, Ronnie Wood e, como líder, o seu irmão Art Wood (que, anos antes, havia fundado a banda de rock-blues "The Artwoods", onde, entre outros, se encontravam o teclista Jon Lord (depois nos Deep Purple) e o baterista Keef Hartley).
Paralelamente, dá-se a extinção da Immediate Records em 1970. Na sequência disto, houve que tomar a árdua tarefa de decidir o que fazer com o respectivo património, muito do qual terá sido vendido para tentar amortizar as muitas dívidas então pendentes. Por outro lado, é preciso não esquecer o elemento fundamental do muito material gravado proveniente dos diversos artistas e grupos que haviam sido editados pela Immediate ao longo daqueles breves cinco anos. É certo que, durante esse período confuso e incerto, muitas gravações, entre demos e masters, terão passado por diversas mãos, nem sempre as mais idóneas.
Entre estas terá estado quem terá visto nestas tapes uma possivel fonte de lucro, lançando compilações de critério duvidoso e sem o devido rigor. A colectânea de Rod Stewart supra-citada é um exemplo de uma de muitas das que foram convertidas para formato CD. Quem primeiro organizou a selecção básica, terá decerto também recorrido ao precioso filão da Immediate Records e acabaria por incluir nas gravações escolhidas algumas pertencentes ao repertório dos Small Faces, confundindo a voz de Steve Marriott com a de Rod Stewart que se havia tornado no vocalista principal do grupo Faces, sucessor da outra banda. Muito provavelmente, fitas relativas ao mesmo período estariam armazenadas no mesmo sítio (ou caixote) e numa desorganização completa, que era o que estava a acontecer com os bens pertencentes à Immediate Records. Isto terá facilitado, para um compilador pouco cuidadoso, a troca de títulos de vários temas. Para mais, esse mesmo compilador não terá conseguido entender a caligrafia de quem escrevera esses títulos nas etiquetas das caixas das respectivas tapes e acabou inventando, pelo menos, dois novos temas para o vasto repertório de RodStewart - os já referidos "Sparky Rides" e "Red Ballroom". Há erros para a eternidade...
Felizmente, uma editora muito competente, a Sanctuary Records, através da sua Castle Communications, acabou por ficar, gradualmente, com a posse de muito desse precioso material da Immediate Records, tendo, com alguma regularidade, editado diversas compilações bastante interessantes e essenciais.
A primeira fase da carreira artística de Rod Stewart tem passado um tanto quanto ao lado de muitos, mesmo incluindo fãs. Quando se lança um olhar para os tempos anteriores a 1970, muitos não vêem mais do que um denso nevoeiro onde se distinguem apenas algumas formas enigmáticas. A sua carreira de cantor começou a dar os seus primeiros passos ainda no tempo do liceu, ao formar grupos musicais de ocasião com alguns colegas e amigos que partilhavam os mesmos gostos musicais, com predomínio para o “skiffle”, que então fazia moda em terras britânicas. Ao abandonar a escola ingressou em diversos trabalhos de curta duração, tendo, pelo meio, feito várias tentativas para fazer carreira no futebol, outra das suas grandes paixões. Algum tempo depois, decide investir no seu talento para a música e integra, pelo menos, uma de diversas bandas então existentes que tocavam jazz e blues, para além de viajar e fazerem diversos espectáculos dentro e fora das ilhas britânicas. Numa destas ocasiões, é preso por “vagabundagem” e repatriado para Inglaterra. A partir daqui, Stewart começa a tentar a sua sorte, igualmente, pelo circuito dos bares e pequenas casas de espectáculo. Começa a ser convidado a participar como mais um elemento convidado em algumas dessas bandas obscuras que actuavam, esporadicamente, nesses locais. Acabará mesmo, por essa altura, por participar na gravação de um “single”, de um grupo que não teria qualquer impacto comercial. É numa dessas ocasiões que começa a chamar a atenção de um cantor branco de blues, que já era mais ou menos conhecido nos circuitos musicais britânicos: “Long” John Baldry. Este convidá-lo-ia a ingressar no seu grupo de então, “Hoochie Coochie Men”, onde chegaram a partilhar a voz principal, e isto constituiria o seu verdadeiro “pontapé-de-saída” no começo da sua longa carreira musical que perduraria até hoje. Rod Stewart tornar-se-ia uma presença cada vez mais notada nos diversos espectáculos de “rythmn’n blues” que se realizaram em Inglaterra, nesse começo de 1964, apesar de, inicialmente, devido à sua natural timidez, sofrer de um certo “stage-fright”, ou seja, receio de actuar em público. Este contacto mais directo com o panorama musical de então, vai-lhe abrir as portas do estúdio onde ele gravaria o seu primeiro verdadeiro disco “single” a solo, no Verão de 1964. No lado A estava o tema “Good Morning Little Schoolgirl” e no lado B “I’m Gonna Move To The Outskirts Of Town”. No entanto, estes dois temas eram apenas uma selecção feita a partir de uma série de “demos”, essencialmente constituídas por “covers” de temas já existentes de blues, da autoria de nomes consagrados, como Jimmy Reed e Willy Dixon. Só os dois temas incluídos nesse seu primeiro “single” a solo, receberiam o tratamento e os arranjos finais devidos, tendo os restantes ficado inéditos e inalterados por vários anos. Acabariam por surgir, por volta de 1976, numa colectânea de baixo custo editada por uma editora pequena. Por esta altura, em meados da década de 70, já Rod Stewart era um cantor consagrado.
Foi apenas com a sua posição de cantor principal no “Jeff Beck Group”, que Rod Stewart começou a ser verdadeiramente conhecido do grande público. Foi, decerto, devido à sua peculiar voz e à sua muito pessoal forma de interpretar temas de rock e blues, que os dois álbuns lançados por este grupo, em 1968 e 1969, foram um êxito muito expressivo nos dois lados do Atlântico. No entanto, uma reunião tão perfeita de vários talentos musicais, acabaria por desencadear um óbvio confronto de personalidades, o que esteve, com certeza, implicado na dissolução deste grupo, ao fim de apenas quase dois anos de reunião. Dissolvido o “Jeff Beck Group”, Rod Stewart pode dedicar-se definitivamente à sua carreira a solo, com a gravação do seu primeiro álbum, saído no Outono de 1969. Este álbum seria primeiro lançado nos Estados Unidos, sob o título óbvio de “The Rod Stewart Álbum”, mas teria um título diferente na sua edição britânica, escolhido a partir de um dos seus temas: “An Old Raincoat Wouldn’t Let You Down”. E aqui começaria uma história de sucesso e consagração, já muito conhecida do público em geral.