Este pintor português nasceu na Nazaré em 23 de Dezembro de 1952. Aqui viverá durante a infância e a adolescência, desenvolvendo um crescente gosto não só pela pintura, como também pela leitura que seria um dos elementos inspiradores de muito da sua obra futura. Esses primeiros anos na Nazaré, constituirão os seus primeiros elementos de inspiração artística, que ele nunca deixará, ao longo das suas diversas obras, de evocar e revisitar de quando em quando. As suas gentes, em grande parte ligadas à actividade piscatória e, sobretudo, sua rica paisagem, plena de contrastes e perspectivas, as casas, sempre com o mar em pano de fundo, irão enformar muito do seu subconsciente de artista.
No entanto, só será a partir de 1970, que a sua carreira de artista sofrerá o impulso determinante e a consistência necessária e verdadeiramente se iniciará. Nesse ano, ele ingressou com boa média na Faculdade de Medicina de Lisboa e vem residir nesta cidade, nunca deixando de regressar à sua terra natal sempre que podia. Aos poucos, começa a contactar com gente que partilhava gostos artísticos e literários muito semelhantes e que o introduzirá em círculos de relações mais ou menos restritos onde a produção cultural era fervilhante.
Graças a isto, vai conhecendo a obra pictórica de diversos artistas de nacionalidades e épocas diferentes, ao mesmo tempo que, devido à sua outra paixão, a leitura, alarga os seus conhecimentos e horizontes literários. De facto, na sua obra, a pintura surgirá, muitas vezes, de mãos dadas com a literatura.
Neste começo da década de 70, surgem os seus primeiros trabalhos pictóricos onde já revela um estilo muito próprio, embora inspirando-se em muito daquilo que observava noutros pintores e desenhadores, incluindo seus contemporâneos. Organiza as suas primeiras exposições individuais, começando por uma na Comissão Municipal de Turismo da Nazaré. Pela mão de alguns artistas, com quem vai trocando impressões, "descobre" o Surrealismo. Entre estes artistas estava Mário Cesarini. De facto, os seus desenhos deste período, devem muito ao Surrealismo, embora o posterior amadurecimento da sua obra não o impeça de a ele retornar. Intencionalmente ou não, os seus primeiros desenhos eram parcos em elementos pictóricos, nomeadamente no que diz respeito à cor. Esta, no entanto, tornar-se-à um elemento cada vez mais importante na estética da sua pintura, tendo Mário Botas manifestado uma crescente preferência pela aguarela.
Por outro lado, enquanto pessoa atenta à realidade nacional e internacional, Mário Botas também encontrará aí diversos motivos de inspiração para os diversos "personagens" dos seus desenhos. Muito à maneira de diversos artistas nacionais durante esses anos finais do Estado Novo, Mário Botas não resiste a satirizar diversos aspectos da realidade social e cultural portuguesa, de uma forma propositadamente quase imperceptível à primeira vista. Desta forma, o surrealismo recém-descoberto por M. B., será o seu recurso mais eficaz para transmitir a mensagem pretendida, fazendo-a chegar aos que partilhavam a sua visão crítica do Portugal de então e confundindo os adversários.
Em paralelo, faz o seu curso de Medicina sem quaisquer problemas, conseguindo mesmo uma média relativamente alta, apesar de, com frequência, ser visto a desenhar durante as aulas. Por outro lado, começa a desenvolver o gosto pela viagem, que constituirá uma forma de contactar mais ao vivo com a arte que se ia produzindo nos outros países, sem esquecer os artistas já consagrados pela História, bem como um elemento adicional de inspiração para os seus cada vez mais complexos desenhos.
Em 1975 conclui o curso de Medicina, com boa classificação, começando de seguida a frequentar um estágio de Psiquiatria. Pretendia fazer da Medicina a sua carreira principal e o seu modo de vida, surgindo a pintura como uma actividade secundária, um hobby, a que M. B. dedicaria o seu tempo livre.
No entanto, os seus planos não se concretizariam nunca. Em Setembro de 1977, na sequência de se vir sentindo mal há algum tempo, recebe o diagnóstico, já suspeitado, de uma leucemia.
É então que a vida de Mário Botas sofre uma trágica reviravolta. Pressentindo que não lhe restaria muito tempo de vida, em virtude de a leucemia ser uma doença mortal virtualmente incurável, decide abandonar a Medicina e dedicar-se a tempo inteiro à pintura. É a forma que ele encontra não só para se abstrair do seu drama, como também de deixar algum legado para a posteridade, algo onde ele sinta que a sua existência se perpetuará. Acabará também por ser uma válvula de escape para os seus medos e sonhos.
Será durante este período, entre 1977 e 1983, que Mário Botas produzirá não só o grosso da sua obra, como também os seus desenhos e pinturas mais interessantes e emblemáticos. Um bocado à maneira de tantos artistas ao longo da História, o saber-se condenado exacerbou-lhe o seu génio criativo. Tudo aquilo que o seu espírito havia absorvido nos seus anos de formação, quer do ponto de vista artístico, quer literário, se irá exprimir na sua máxima plenitude nas muitas telas onde M.B. lançará o seu traço e as suas cores.
Mário Botas viveu intensamente, dentro daquilo que a sua saúde em declínio foi permitindo, pintando, lendo e convivendo o mais que podia. Os que lhe são próximos, conscientes da sua real situação, foram-lhe dando todo o apoio possível.
Para além disto, deslocou-se ao estrangeiro diversas vezes, para ser observado por médicos, aproveitando, nessas estadias, para expor os seus trabalhos em galerias e contactar com mais artistas, não necessariamente pintores. Entre estes estava o compositor John Cage, que se tornará seu amigo.
No começo do ano de 1983, estando a sua doença muito agravada, decide, mais uma vez, consultar médicos estrangeiros, na esperança de conseguir algumas melhoras. Desenganado, fica, ainda mais do que antes, ciente de que não lhe restaria muito tempo de vida, decide empenhar-se, quase até ao limite das suas forças, na sua obra. São precisamente destes seus últimos meses de vida, os seus desenhos e pinturas mais emblemáticos. Infelizmente, o seu mal, a leucemia, acabou por vencê-lo a 29 de Setembro de 1983.
Documentário "Perfil: Mário Botas", datado de 1978 e da autoria de Alexandre O' Neill e Rui de Brito.
Eu, "Mário Botas", da autoria de Almeida Faria, datado de 1989. Um documentário obrigatório, para quem quer entrar em contato com a vida e obra do multifacetado pintor-poeta Mário Botas. Muito raramente transmitido na televisão e a más horas...
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