segunda-feira, outubro 17, 2011

Três nações na disputa da hegemonia europeia

Numa importante parte da obra “A Grande Transformação”, faz-se um enfoque na componente das divisões no campo das relações laborais, como um reflexo das muito complexas divisões que se verificam na sociedade, regressando-se mais uma vez à ideia do Homem que se foi transformando, gradualmente, em máquina de produção transaccionável e sujeito às leis do mercado, simultaneamente impositivas e flexíveis.



Apesar de aqui se dar, como acontecera nos outros capítulos, uma preferência à realidade do mundo ocidental, em geral, é dado um especial destaque a três países fundamentais neste período: a Inglaterra, a França e a Alemanha. Não quer isto dizer que outros, como a Itália, sejam ignorados. O que acontece é que, durante estes 150 anos, entre o começo do século XIX e a Segunda Guerra Mundial, estes três países ocuparam um lugar exemplarmente importante no xadrez mundial. Eram três nações que representavam a ponta-da-lança em termos de desenvolvimento nos mais variados aspectos e, desta forma, que nelas se passava, ecoava nas outras que lhes eram próximas, quer em termos geográficos, quer em termos de relações comerciais e diplomáticas, quer em termos de interesses em comum.


Devido a esta importância central, estas três nações tinham entre si, há muito, um esquema de relações, extremamente complexo. Haviam estado, por diversas vezes, em guerra entre si, não raras vezes uma contra as outras duas que, oportuna e temporariamente se aliavam mutuamente, antes de surgir, entre estas duas últimas, novas sementes de rivalidade.


Basicamente, este século XIX avançava com esta realidade muito vincada nas suas costas. Basta referir, por exemplo, as Invasões Francesas, onde França se opunha à Inglaterra e a Alemanha. Por outro lado, enquanto a França se vinha recompondo do completo falhanço do seu sonho imperialista, a Inglaterra e a Alemanha disputavam, entre si, uma guerra surda no sentido de conseguirem uma hegemonia dentro do quadro europeu, nos mais variados campos. Um deles, senão o mais importante, consistia no domínio da zona marítima que servia as costas europeias.


A Inglaterra, uma nação pioneira no campo da Revolução Industrial, sentia uma necessidade absoluta de superar a sua insularidade geográfica, que tornava algo insegura a, então vital, manutenção do seu vasto império colonial. No entanto, a sua vasta extensão de zonas costeiras navegáveis, desde logo, dotou esta nação de um poderio naval invejado pela generalidade dos outros países e permitiu-lhe ser um competidor a não ignorar no campo das relações comerciais. Para além do mais, é preciso não esquecer que as Ilhas Britânicas constituiam um território quase imune a qualquer invasão inimiga. O Canal da Mancha desde sempre, foi a sua muralha natural mais preciosa e permitiu que a Inglaterra quase não conhecesse os horrores dos grandes conflitos, evitando, entre outras coisas, que os seus vastos recursos naturais sofressem danos maiores e as suas populações corressem os mesmos riscos a que as outras nações no continente europeu estavam expostas.


A Alemanha, por seu turno, encontrava-se fragmentada em vários pequenos estados, cada um deles com o seu passado cultural próprio, e, para adquirir a solidez necessária, havia quanto antes de conseguir uma forma de unificação. Tal foi conseguido, pela mão de Otto Von Bismark. Mesmo assim, era preciso não esquecer que, apesar desta união amigável, havia uma hegemonia prussiana sobre todos os outros estados germânicos. Conseguida a unificação, a “nova” Alemanha conseguia, finalmente, tirar partido da sua localização geográfica central e dos vastos e abundantes recursos do seu solo, nomeadamente no que respeita a minério. Tinha uma extensa zona costeira que lhe permitia manter sólidas relações com os grandes centros comerciais de então, sem esquecer o passado da Liga Hanseática que abrangia também importantes portos de mar holandeses. Por outro lado, o facto de fazer fronteira com um importante leque de nações, encorajava a um, inicialmente secreto, desejo expansionista.



Vale a pena não esquecer que, tal como a Inglaterra, tanto a França e, mais tarde, depois da década de 1880, a Alemanha, possuíam o seu importante quinhão de colónias, ainda que em menor número. Havia que assegurá-las, apesar de haver uma surda tentação de estender a sua influência para outras colónias pertencentes a outras nações.



À parte a curta, mas marcante, guerra de 1870-71 entre a Alemanha imperial e a França, que foi desvantajosa para esta última, o século XIX, em especial a sua segunda metade, foi um período de acalmia bélica. As “guerras” agora eram diplomáticas e comerciais e, assim se mantiveram durante muitas décadas, até tudo se desmoronar em 1914.

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