sábado, fevereiro 12, 2011

Património e patrimónios


O livro em questão, suscita, logo numa primeira abordagem, todo um conjunto de reflexões acerca dessa problemática inesgotável do património, sempre em vias de se perder ou desgastar perante as imparáveis e sucessivas vagas do tempo e das, sempre necessárias, tentativas de o proteger, bem ou mal sucedidas.

Hoje em dia, o problema da salvaguarda do património, seja este local ou mundial, é um assunto de primeira linha, que tem vindo a suscitar inúmeras e acesas discussões. Em primeiro lugar está em saber de facto o que pode ser caracterizado como património. Em segundo lugar, há que verificar, na prática, quais os meios existentes para se conseguir quer evitar o seu desaparecimento ou degradação, quer possibilitar a sua recuperação ou reconstituição.

Antes associado exclusivamente às coisas materiais, o património viu ser acolhidos na sua alçada todo um conjunto de aspectos, valores e significados, mais espirituais do que concretos, mais emocionais do que físicos. Desta forma, ao abranger uma vasta área de bens materiais, também passou a incluir a energia que lhes dá vida e os faz mover.

Como herança que é de outras épocas da Humanidade, traz consigo um pouco de todos aqueles que deixaram obras de diversos tipos, quer para melhorar a sua vida e a dos outros, quer para escapar ao implacável esquecimento. Preservar o património, ou melhor dizendo, os patrimónios, é uma forma de todos se conhecerem um pouco mais.
É inevitável que não seja possível salvaguardar ou manter intacto tudo aquilo que represente o passado nas suas mais diversas facetas. Faz parte do evoluir de qualquer sociedade pôr em causa muito das instituições e estruturas que o presente invalidou ou revelou possuírem toda uma toda uma série de limitações, imperfeições e fragilidades.
A realidade humana está em constante mutação e qualquer fenómeno de estagnação representa sempre uma desvantagem, quer se fale em termos de tecnologia, cultura, valores sociais ou outros aspectos que enformam as sociedades. No entanto, uma sociedade, na sua ânsia de não ser ultrapassada por todas as outras, não deve nunca renunciar aos seus valores básicos que lhe dão identidade e autonomia, correndo o risco de ficar acéfala e, paradoxalmente, mais vulnerável a todas as peripécias e ratoeiras que o futuro lhe vai colocando pelo caminho.
Por isso, cada nação deverá ter bem presentes todos os lugares, símbolos, objectos e tradições que melhor representem os momentos mais cruciais da sua memória. Em praticamente todos os países do mundo, e em face da legislação existente, percebe-se que o património histórico e cultural seja uma prioridade dos respectivos governos. Já existem bastantes locais que, inclusive, obtiveram o estatuto de Património da Humanidade, o que revela antes de mais, uma unanimidade a nível de consciência.
A nível prático, existem ainda muitas lacunas, sobretudo relativamente a certo tipo de património situado longe das zonas com maior densidade populacional. Este encontra-se, muitas vezes, a ser utilizado para os fins menos indicados, descaracterizado, arruinado e sujeito ao roubo e ao vandalismo. Por outro lado, ainda domina uma política relativamente elitista, quanto ao que deve ser salvaguardado. Valorizam-se por demais os grandes monumentos isolados, em detrimento dos núcleos arquitectónicos integrados onde, inclusive se incentive o artesanato e o comércio tradicional.
A nível da cultura material, as obras artísticas continuam a ser sobrevalorizadas, apesar do grande desenvolvimento de áreas temáticas como a Arqueologia Industrial e o aparecimento de museus dedicados a objectos e colecções não artísticas, muitos deles em espaço aberto.
Existe ainda uma perspectiva algo materialista do conceito de património, que secundariza a cultura não material, onde predomina a oralidade na transmissão dos conhecimentos. Mesmo neste campo, é dada a primazia às coisas materiais onde ela se manifesta, como acontece com os vestuários regionais, esquecendo-se todo um conjunto de tradições e rituais, entre outros aspectos, com séculos de existência.
Apesar de tudo, é possível verificar que, graças a incentivos, muitas vezes da parte de pessoas e instituições exteriores aos poderes instituídos, muito já se fez em nome da salvaguarda das heranças culturais da Humanidade. Mas há ainda um longo e acidentado caminho para percorrer.