A Checoslováquia foi uma das novas nações criadas no século vinte na sequência do desmantelamento dos grandes impérios europeus, após a Primeira Guerra Mundial. Esta era constituída por regiões antes integrantes do desaparecido Império Austro-Húngaro dos Habsburgos: Boémia, Morávia, Eslováquia e a Ruténia Carpatiana.
As novas fronteiras haviam sido criadas englobando, com alguma precisão, a vasta área geográfica ocupada por estas zonas.
O problema começou a surgir, desde logo, devido ao facto das populações englobadas nestas regiões não serem completamente homogéneas, pelo menos a nível étnico. Havia séculos que existiam aglomerados populacionais, minoritários no computo geral, de gentes provenientes de outras etnias, em especial germânica e húngara, que se haviam integrado, mais ou menos, no seio dos povos que iriam constituir a Checoslováquia. A importância destes dois grupos étnicos, com língua própria, havia crescido, inclusive em número, sobretudo durante a constituição definitiva do Império Austro-Húngaro.
Devido ao facto de estarem intimamente ligados às duas facções então dominantes, era certo que usufruíssem de algum privilégio e consideração por parte dos respectivos poderes. Devido à grande extensão, sem delimitações internas definidas, do Império Austro-Húngaro, nunca tinha havido nenhuma questão quanto à localização das várias etnias dentro dos seus limites. No entanto, desde já há várias décadas que surgiam movimentos autonomistas, severamente reprimidos pelas forças imperiais, dentro dos povos de diversas zonas etnicamente predominantes. Entre estes incluíam-se os Checos e os Eslovacos. Estes movimentos autonomistas foram uma das razões que desencadearam a Primeira Grande Guerra Mundial.
Terminada a Primeira Guerra Mundial, e sendo a Áustria-Hungria um dos principais derrotados, logo os seus antigos domínios são fragmentados em novas nações independentes. Decide-se privilegiar os povos e etnias antes subjugadas em detrimento, claro está, das, agora separadas, Áustria e Hungria. Devido à natural irregularidade no interior de um vasto império, é certo que os limites físicos reais de uma região onde predominasse uma etnia, não estavam linearmente definidos. Desta forma, era certo que existiriam dentro de uma região especificada, indivíduos unidos por laços étnicos a outra região diferente.
Dado que os indivíduos de origem germânica e húngara haviam sido os dominantes e mais poderosos no interior deste império, era certo que teriam mais facilidades em se disseminar no interior dos seus limites, usando apenas os recursos naturais como o seu principal critério de distribuição populacional.
Como era de esperar, a nova nação da Checoslováquia teria, no seu interior, um número apreciável de gentes de origem étnica húngara e, sobretudo, germânica, em especial junto às suas recém-criadas fronteiras. Desta forma, nas zonas Sul e Sueste, mais perto da Hungria, predominavam populações húngaras, enquanto que a Norte e Noroeste, mais perto da Áustria, havia um forte contingente germânico.
Os povos de língua e etnia germânica, que se localizavam na região montanhosa dos Sudetas, constituíam um grupo particularmente forte, não só em termos numéricos, como por, desde logo, terem tido uma vocação claramente nacionalista, dificultando sistematicamente as decisões da nova república que os governava e recusando a maior parte dos acordos que o poder central ia tentando com eles elaborar. A vasta minoria germânica dos Sudetas, entre outros aspetos, sentia-se discriminada pelo poder central. Muitos dos seus elementos, alegavam terem sido vítimas de ações arbitrárias e violentas por parte das autoridades checoslovacas, embora não seja possível confirmar até que ponto isto seria verdadeiro. A região dos Sudetas era de particular importância para a Checoslováquia, não só devido ao seu valor estratégico, situando-se aí o essencial das suas defesas fronteiriças ocidentais, como também por ser uma zona fortemente industrializada.
O precário equilíbrio que existia entre esta comunidade germânica e o poder central foi definitivamente destruído com a Grande Depressão, iniciada em 1929. A percentagem de desempregados entre os “Alemães dos Sudetas”, era visivelmente mais alta do que no resto da população da Checoslováquia, o que aumentou ainda mais o seu descontentamento e desencadeou, de tempos a tempos, diversas revoltas e greves. Paralelamente, o Partido Nazi, liderado por Adolf Hitler, havia conquistado o poder, no final de Janeiro de 1933. Uma das suas premissas, desde logo era dar apoio, até certo ponto moral, a todas as comunidades germânicas que se sentissem oprimidas pelos governos dos países onde estivessem localizadas. Logo de seguida, nestas comunidades, constituem-se forças políticas abertamente de tendência nazi, que tentavam dar voz às aspirações de há muito. A comunidade germânica dos Sudetas, foi das mais ativas neste campo, assumindo-se, agora mais do que antes, em praticamente “guerra aberta” com o governo central checoslovaco. Como era natural, a sua atitude declaradamente hostil, encontrava, da parte deste, respostas cada vez mais violentas, mas menos eficazes.
Ao tomar conhecimento dos projetos expansionistas do governo alemão nazi, o governo central de Praga começa a ponderar seriamente em enviar e instalar a título permanente forças militares e policiais para a região dos Sudetas. A intenção é não só para reforçar a segurança da zona fronteiriça, como também para melhor poder controlar a comunidade germânica aí existente, cuja ebulição separatista e nacionalista havia chegado ao rubro. Os receios de Praga começaram a ganhar mais força sobretudo a partir da entrada da recém-criada “Wehrmacht” na Renânia, até então desmilitarizada e da intervenção aberta na Guerra Civil de Espanha, para apoiar os revoltosos nacionalistas, tudo isto em 1936.
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Edvard Benès.
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Neste ano, ocupava o cargo de Presidente da República Checoslovaca Edvard Benès. Seria este mesmo presidente a assistir às cedências afrontosas das principais potências europeias face às exigências territoriais de Adolf Hitler.
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Neville Chamberlain e Adolf Hitler em 1938.
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Este já havia anexado a Áustria na “Grande Alemanha” e pretendia, nesse mesmo ano de 1938, incluir também a zona dos Sudetas. Foi na sequência disto que se agendou a Conferência de Munique, onde a Checoslováquia seria obrigada a ceder ao 3º Reich a sua zona fronteiriça dos Sudetas, para grande júbilo dos aqui residentes.
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Neville Chamberlain, Édouard Daladier, Adolf Hitler, Benito Mussolini e o Conde Galeazzo Ciano.
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Não aceitando compactuar com esta situação, Edvard Benès ver-se-ia obrigado a abdicar do poder em Outubro de 1938, partindo para o exílio em Inglaterra, juntamente com a família e vários antigos elementos do seu staff. Suceder-lhe-ia Emil Hácha, por ser católico e não ter qualquer relação direta com esta perda territorial, a qual se esperava ficar por aí. Para além de visivelmente mais velho do que o seu antecessor, Emil Hácha era um homem enfraquecido pela falta de saúde e com pouca firmeza. Será esta falta de firmeza que o levará a integrar à força, até 1945, um governo-fantoche sob a alçada da Alemanha nazi. Logo no ano de 1939, não se conseguirá opor à declaração de independência por parte da Eslováquia, incentivada decerto pelas potências do Eixo, do qual a Hungria era um aliado.
Logo em meados de Março de 1939, na sequência de uma conversa com Adolf Hitler, em que este o ameaçou, inclusive, de bombardear Praga, Emil Hácha, decide não se opor à entrada das tropas hitlerianas no que restava do território da Checoslováquia, que, até 1945, se passaria a designar por “Protectorado da Boémia e da Morávia”. Emil Hácha manteria o cargo de presidente, mas apenas na aparência, pois fora obrigado a ser totalmente fiel aos sucessivos governadores alemães desse “protectorado”, até ao final da Segunda Guerra Mundial. Desta forma, a região antes designada por Checoslováquia seria, a par de muitas outras, sujeita ao domínio totalitarista e às leis do 3º Reich, com todas as consequências negativas, já longamente conhecidas, para a sua população e economia.
Nos meses seguintes ao final da Segunda Grande Guerra, houve, da parte dos antigos dominados, todo um conjunto de violentas ações no sentido de expulsar todos os indivíduos de etnia germânica, com especial destaque para todos aqueles que haviam colaborado com os invasores nazis. Muitas delas foram executadas espontaneamente pelas populações, desejosas tanto de legítima vingança, como de recuperar antigas posses confiscadas quer pelo 3º Reich invasor, quer pelos residentes de etnia germânica que foram muito privilegiados durante estes quase seis anos de usurpação territorial. Para impulsionar esta regularização territorial da Checoslováquia, foram postos em prática os “Decretos Benès”, elaborados desde alguns anos antes pelo governo democrático, exilado em Inglaterra desde 1938, encabeçado pelo ex-presidente Edvard Benès.
Estes decretos continham diretivas muito específicas acerca da nova redistribuição do território checoslovaco, com especial destaque para a expulsão não só dos cidadãos de etnia germânica, muitos deles residentes até então muito problemática zona dos Sudetas, mas também dos da minoria húngara, estes mais predominantes na zona sueste da Checoslováquia. É preciso também não esquecer os diversos indivíduos provenientes destas duas etnias que viviam espalhados por todo o território checoslovaco, não raras vezes em casamentos mistos.
Os decretos elaborados pelo governo, até então exilado, foram aplicados em toda a sua extensão possível pelas novas autoridades checoslovacas, fortemente apoiadas pelo seu povo em geral. Houve, como é natural, situações algo polémicas durante estes processos de expulsão, nomeadamente através das previstas represálias contra estas populações que, durante séculos, haviam estado mais ou menos bem integradas nesta sociedade. Houve mesmo relatos de casos de violência extrema, incluindo tortura e homicídios, praticados indiscriminadamente contra estas minorias agora indesejáveis, independentemente da idade das vítimas. Como acontece sempre nestes casos, houve tentativas tanto para exagerar os factos, da parte de quem agora estava do lado dos escorraçados, como para reduzir a sua importância, senão abafar, da parte dos que agora pretendiam livrar a sua nação de quaisquer elementos que pudessem causar instabilidades futuras a nível do país, agora livre do jugo nazi.
Foi, sobretudo, a nível da população de língua e etnia germânica em que mais incidiram estas medidas de expulsão, que resultaram no êxodo forçado de, aproximadamente, 90% ou mais dos seus integrantes. Mesmo assim, ficariam alguns devido, entre outros aspectos, ao facto de estarem inseridos em casamentos e famílias mistas e também por nunca terem apoiado os invasores nem abdicado da sua nacionalidade checoslovaca e, dentro destes últimos, poderem ter um papel importante na futura recuperação da Checoslováquia. Edvard Benès regressaria de novo ao seu país logo em 1945, assumindo o seu lugar de dirigente máximo da sua nação, até Fevereiro de 1948, na sequência da tomada de poder por parte de uma força comunista de influência soviética, que o leva à resignação, tendo falecido em Setembro desse ano. De qualquer forma, todos estes processos de expulsão e expropriação, rodeados, muitas vezes, por atitudes de extrema violência, ainda que compreensíveis, provocariam alguns ressentimentos que, ainda hoje, perduram por entre diversos sectores da população quer da Alemanha, quer da Hungria. Em ambos os países, ainda existem associações, cada vez mais constituídas pelos descendentes dos espoliados originais, que reclamam, tanto ao actual governo da República Checa, como ao da Eslováquia, reparações pelas perdas e danos sofridos.
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