Arthur Harris, nascido em Cheltenham no ano de 1892, foi uma das personalidades militares mais polémicas do século XX. Foi marechal do Comando de Bombardeiros britânico durante a maior parte da Segunda Guerra Mundial. Este comando era uma secção da Royal Air Force, com a principal função de executar operações de bombardeamento aéreo nos territórios sob o domínio do 3º Reich de Hitler, quer se tratasse da própria “Grande Alemanha”, como dos seus países aliados ou conquistados. Na teoria, o papel de qualquer força aérea seria o de apoiar as missões terrestres, graças à sua maior capacidade de avanço que lhe permitia alcançar as zonas a atacar mais rapidamente ou a dar uma resposta mais eficaz aos ataques dos inimigos, quando não era possível alcançá-los por via terrestre. Ao atacar o inimigo, a força aérea reduzia-lhe a capacidade de defesa e de ataque, tornando muito mais fácil o avanço das tropas terrestres. Podia-lhe causar mesmo, com maior ou menor sucesso, danos na sua zona de retaguarda, que estaria, em princípio, a salvo das investidas dos exércitos, e onde estariam as suas reservas tanto de homens como de materiais, chegando mesmo a ser um perigo sempre constante para as suas essenciais linhas de abastecimento.
Graças aos avanços tecnológicos conseguidos desde o final da Primeira Guerra Mundial, os aviões foram-se transformando em máquinas cada vez mais sofisticadas, dotadas de maior velocidade, maior zona de alcance e maior capacidade destrutiva. Um outro aspecto fundamental, foi a sua maior autonomia, que lhe permitiria executar as suas missões com uma antecedência muito significativa, relativamente aos progressos conseguidos a nível terrestre. Por um lado, poderia quase levar à derrota as forças inimigas, fazendo com que os exércitos terrestres convencionais quase não tivessem que sofrer baixas significativas ao alcançar os seus alvos, por outro, poderia, em situação defensiva, atrasar o avanço dos atacantes, mesmo que não existisse uma força terrestre devidamente organizada. Aliás, aos olhos mesmo dos próprios civis, as forças aéreas haviam começado a surgir como muito mais temíveis do que os próprios exércitos convencionais, por poderem levar a destruição e a morte muito mais longe, quase independentemente da distância real a que os seus inimigos se encontrassem.
Um dos filmes mais importantes desse tempo, "A Vida Futura" ("Things To Come") de 1936, baseado numa obra de H.G. Wells, preconizava, numa das suas partes mais dramáticas, a destruição de uma grande cidade inglesa (aqui denominada "Everytown", mas claramente inspirada em Londres), pelo bombardeamento por parte de uma nação inimiga e anónima. Acabou por ser, de certa forma, premonitório relativamente ao que aconteceria a muitas povoações na 2ª Grande Guerra Mundial, que se aproximava a passos largos.
A Vida Futura ("Things To Come") (1936).
No filme, a cidade inglesa "Everytown" era completamente destruída num único e devastador bombardeamento, que deixava atrás de si uma mortandade absolutamente apocalíptica. Isto era demonstrativo do que ia no subconsciente da generalidade da população inglesa. Aterrorizava-os a simples ideia de serem bombardeados por uma nação inimiga militarmente poderosa. Aliás, em 1940, quando se começou a perceber como certas e previsíveis as incursões aéreas germânicas no espaço aéreo britânico, o comum dos cidadãos britânicos pensava que "iriam morrer todos". Felizmente, para o povo britânico, as coisas acabaram por não se passar assim de uma forma tão extrema... Ironicamente, e ao fim e ao cabo, o mesmo não se poderá dizer da Alemanha nazi, que foi quem iniciou essa política de usar o "terrorismo bélico" como forma "legítima" de fazer a guerra...
A década de 1930 foi profícua em demonstrações da crescente capacidade do avião enquanto máquina de guerra. Dois exemplos dessas demonstrações foram a invasão da Manchúria pelo Japão imperialista no começo dessa década e a Guerra Civil Espanhola de 1936-39, onde se bombardearam indiscriminadamente populações civis, como forma de as aterrorizar, afectando-se negativamente o seu moral.
Conscientes dos efeitos destruidores e mortíferos dessa então moderna arma de combate, diversos países, nomeadamente a Grã-Bretanha e os EUA, haviam prometido, em caso de guerra, fazer os possíveis por não atacar alvos civis e procurar sempre centrar os ataques no que tivesse valor militar, estratégico e, quando muito, industrial. Isto implicaria, desde logo, a necessidade de aumentar a precisão dos ataques e tal só seria possível vendo bem esses alvos, através de voos a não muito grande altitude e de preferência diurnos e sem grande nebulosidade. No entanto, a partir do estalar da 2ª Guerra Mundial, em 1939, estas premissas começaram a ser postas em causa. Isto porque uma boa e precisa visibilidade dos alvos, implicaria, também ficar ao muito fácil alcance dos meios de defesa anti-aérea, o que tornaria, decerto, qualquer ataque aéreo num perfeito suicídio para os seus pilotos, para além de se revelar extremamente dispendioso em termos materiais para a força atacante.
De facto, os acontecimentos logo nos primeiros anos do conflito bélico, não fizeram mais do que comprovar estas evidências. A Royal Air Force, depois da capitulação da França e da evacuação de Dunquerque, era a única força militar que, na prática, se mantinha em combate contra o surpreendentemente rápido avanço das tropas do 3º Reich nazi, excluindo alguns corpos expedicionários que defendiam os seus territórios coloniais e foram chegando, quase a conta-gotas, ao continente africano. Nos primeiros anos do conflito mundial, a Grã-Bretanha só dispunha com capacidade de resposta imediata, as suas R.A.F. e marinha Royal Navy. De facto, só esta última, no começo, podia fazer verdadeiramente frente às forças bélicas de Hitler. A Royal Air Force ainda não dispunha de uma capacidade material e, sobretudo, numérica para superar o então superior poderio aéreo da Luftwaffe.
Por outro lado, os ataques aéreos que a Luftwaffe estava a efectuar sobre os territórios que invadia, bem como as informações dos seus danos, estavam a provocar um sentimento de crescente receio nas populações dos países aliados e neutros. Muitas vezes optava-se por quase não oferecer grande resistência aos invasores, por se temer as represálias destes. Isto também contribuiu para criar uma imagem deinvencibilidade das forças do3º Reich, que já havia de certa forma, sido fomentada nos anos imediatamente anteriores à 2ª Guerra Mundial, graças, em grande parte, ao enorme esforço propagandístico por parte dos seus governantes nacional-socialistas.
Era, de facto, verdade que os meios materiais à disponibilidade da Alemanha nazi, no começo do conflito, eram modernos e sofisticados, se comparados com muito do que, na prática, existia à disposição dos outros países. Tanto no que se referia aos muito utilizados veículos motorizados pela Wehrmacht, como à sua aviação e força naval, destacando-se, neste último caso, o predomínio dos submarinos. A sua frota de superfície, era visivelmente inferior à da Grã-Bretanha, mas mostrava uma crescente tendência para aumentar de poder, nomeadamente com a construção de alguns imponentes couraçados, com destaque para o famoso Bismark. No entanto, muitos destes vastos meios bélicos resultavam de projectos concebidos na década de1930 e que ainda não haviam sido experimentados em combate. Havia, como é claro, a tendência para fabricar em série vários exemplares dos mesmos modelos, de forma a se conseguir um bom contingente numérico e, se não se havia descoberto nenhuma falha, mesmo que mínima, havia que seguir em frente nesse mesmo caminho. Dessa forma, foi com esta capacidade material, nunca testada numa guerra real, que a Alemanha nazi, partiu à conquista do Mundo.
É
completamente falsa a ideia que foi com Sir Arthur Harris que mudou a atitude
dos Aliados relativamente aos bombardeamentos. Ele simplesmente lhe deu uma
continuidade mais sólida e definida.
Sir Richard Peirse, o antecessor de Sir Arthur Harris no Comando de Bombardeiros da R.A.F.
Essa
atitude já vinha mudando desde há quase dois anos, na ocasião em que Sir Arthur
Harris tomou posse do seu cargo no Comando de Bombardeiros da R.A.F. É verdade
que, quando se iniciaram as hostilidades, se tentou adotar uma política de
bombardeamentos exclusivamente centrados em alvos de estratégia militar e
industrial. O presidente de então dos E.U.A., F.D. Roosevelt havia apelado para
que se evitasse atingir os civis nas futuras missões dos Aliados na Guerra que
então começava. O próprio primeiro-ministro britânico de então, Neville
Chamberlain, parecia um indivíduo muito cheio de escrúpulos em matéria de
bombardear o inimigo e altamente anti belicista até ao fim. A sua declaração de
Guerra à Alemanha nazi fora pareceu ter sido feita com extrema relutância. A já
muito usada política de não-intervenção havia, afinal, servido para permitir
aos futuros inimigos cometerem abusos a seu bel-prazer. Fora a Itália de
Mussolini na Etiópia, em 1935, e fora também esta, juntamente com a Alemanha de
Hitler, na Guerra Civil Espanhola, que decorreu de 1936 a 1939. Já havia, pelo
menos em Inglaterra, todo um conjunto de vozes a apelarem a uma maior cautela e
prudência na aplicação dessa fórmula tão fácil e comodista de não-intervenção.
Uma destas vozes partia do, então, deputado Conservador, Winston Churchill.
Os
bombardeamentos diurnos sobre alvos precisos, para o qual era necessário ter
uma boa visão do alvo, estavam-se a revelar, logo desde 1939, extremamente
dispendiosos em matéria de homens e material. Se se podia observar, com alguma
precisão, os alvos a bombardear, também se ficava mais exposto às defesas
antiaéreas. Por outro lado, os bombardeiros em manobra de fuga face às
antiaéreas, eram levados, a lançar as suas cargas fora do alvo pretendido, pois
regressar às bases com as “bomb bays” carregadas de bombas era extremamente
perigoso.
Por
outro lado, o inimigo germânico estava a revelar uma “predilecção” por usar os
seus bombardeiros sobre alvos onde as zonas civis ficavam claramente em risco
de serem atingidas. A “fórmula de ataque” que já haviam demonstrado na Guerra
Civil Espanhola seria, decerto, para “repetir”.
A invasão da Polónia em Setembro de 1939, e a não resposta a um ultimato feito à Alemanha nazi para retirar de imediato as suas tropas do território polaco, levou a Inglaterra a declarar a guerra à nação germânica. A Polónia e todos os outros países que a Alemanha nazi acabaria por invadir eram, a partir de então, considerados como pertencendo ao lado aliado. Dado que estes países não possuíam uma capacidade militar, sobretudo no que respeitava às suas forças aéreas, que pudesse fazer frente à, então, tecnologicamente avançada "Luftwaffe", cabia à Grã-Bretanha, enquanto o seu aliado mais bem guarnecido do ponto de vista bélico, prestar-lhes, dentro do possível, o seu auxílio, pelo menos, militar. Daí se explica porque é que e que desde logo, no período de 1939-1940, o Comando de Bombardeiros da R.A.F. havia iniciado incursões aéreas em território germânico, o que levou, do ponto de vista das forças do Eixo, a divulgar a errónea teoria de que havia sido a Grã-Bretanha a "bombardear primeiro". Tratava-se de um auxílio perfeitamente justificado entre forças aliadas. Os mais bem apetrechados e tecnologicamente avançados, como era a Grã-Bretanha, deveriam tentar colmatar as fragilidades dos pior equipados, como eram a Polónia, a Holanda e a Bélgica.
Quando
as forças germânicas haviam iniciado o seu avanço para ocidente, com a invasão
da Bélgica em 10 de Maio de 1940 foi, na noite seguinte, 11 de Maio, lançado um
bombardeamento em Mönchengladbach ou melhor, na zona de Mönchengladbach pois,
como era costume nesta altura, as bombas eram espalhadas, quase
indiscriminadamente, por uma área relativamente vasta. Houve, de facto, a queda
de engenhos explosivos na cidade de “Gladbach”, tendo resultado em 4 mortos, mas
os danos concretos foram baixos ou muito individualizados aqui e ali.
Mönchengladbach, numa fase mais avançada da Guerra.
Mönchengladbach, por volta de 1945.
Imediatamente a seguir, as forças germânicas aproveitam o momentum conseguido com a inesperadamente rápida derrota das forças belgas, para iniciarem a invasão da Holanda. Dias depois, o bombardeamento sobre Roterdão, em 14 de Maio de 1940, havia encorajado o Comando
de Bombardeiros da R.A.F. a levar avante a decisão de uma nova forma de bombardear.
Em
14 de Novembro de 1940, a Luftwaffe germânica havia conseguido um nível de destruição,
então inédito, em Coventry.
O centro de Coventry depois do pior bombardeamento, ocorrido em 14 de Novembro de 1940.
A destruição quase total da Catedral de Coventry, um bom exemplar da arquitetura gótica flamejante de modelo tipicamente britânico, causou particular consternação neste país.
Coventry Cathedral.
Interior da Catedral de Coventry.
Catedral de Coventry depois do bombardeamento de 14 de Novembro de 1940.
Winston Churchill visita as ruínas da Catedral de Coventry.
O edifício original da Catedral de Coventry ficou em ruínas como um memorial de guerra.
Como
forma de resposta a este bombardeamento, que havia provocado, pela primeira
vez, um abalo tremendamente negativo no povo britânico, foi delineada a primeira
operação de bombardeamento em larga escala de Mannheim, que ficou conhecida
pelo nome de “Abigail Rachel”.
Sir Richard Peirse: até 1942 à frente do Comando de Bombardeiros da R.A.F..
O
bombardeamento de Mannheim, representava uma nova atitude por parte do Comando
de Bombardeiros da R.A.F. Pela primeira vez, o alvo expresso desta missão era o
centro da cidade de Mannheim. A maioria das cidades não eram fáceis de localizar
nem identificar nos sistemas de navegação dos radares. Por mais do que uma vez,
as bombas caíram ou em localidades não previstas ou mesmo em campo aberto.
Mannheim, pelo contrário, era relativamente fácil de localizar e, sobretudo, de
identificar.
Mannheim.
Mannheim.
Mannheim.
O elemento distintivo desta cidade, era a planta muito peculiar da
sua zona central. Esta tinha a forma de uma “grelha” perfeita, como os seus
mapas de então bem atestavam. Aliás, esta cidade era conhecida pelo nome de
“cidade quadrado”, pois, vistos de cima, os seus quarteirões tinham uma forma
geométrica muito regular em quadrados e retângulos, não havendo, por isso,
nenhuma praça circular, ao contrário do que acontecia com todo o resto dos
outros centros urbanos. Para além do mais, a sua organização e denominação das
ruas era única no Mundo. A generalidade das ruas era identificada por letras e
números.
Esquema do centro de Mannheim.
Mannheim.
Mannheim.
Mannheim.
Pode-se
afirmar que, nos primeiros meses do conflito, o alvo mais importante desta zona
da Alemanha, não era Mannheim, mas sim Ludwigshafen.
Ludwigshafen.
Esta cidade situa-se na
outra margem do rio imediatamente oposta a Mannheim e é ligada a esta por uma
ponte, a que os habitantes de cada uma dessas duas cidades atribuíam um nome
diferente.
Por outras palavras, os habitantes de Ludwigshafen, chamavam-na
“Ponte de Mannheim” e, por outro lado, os habitantes de Mannheim chamavam-na
“Ponte de Ludwigshafen”. Esta cidade era, realmente, um centro fortemente
industrializado e por isso, um alvo prioritário do Comando de Bombardeiros.
Mannheim quase que foi selecionada por atacado, devido à disposição peculiar
das ruas do seu centro. Obviamente que, localizando-se Mannheim, também se
localizaria Ludwigshafen com mais facilidade e, se assim fosse planeado, as
duas poderiam ser atacadas em simultâneo.
Esquema do centro de Mannheim, com destaque para a localização do referido “Palácio de Mannheim” (“Mannheimer SchloB”) .
“Palácio de Mannheim” (“Mannheimer SchloB”) .
O resultado dessa missão nessa noite
de 16 para 17 de Dezembro de 1940, teve muito menos efeitos práticos do que se pretendia. Devido ao fogo antiaéreo, os aviões foram obrigados a espalhar as bombas por uma vasta área, sem conseguir um ponto de concentração assinalável. Todavia, o efeito psicológico nos habitantes de Mannheim foi tremendo, tal como
fora o primeiro bombardeamento sobre Berlim em 25 deAgosto de 1940. A cidade não
sofreu praticamente danos nenhuns. Todavia, entre os poucos danos sofridos,
estava o seu edifício mais importante: o denominado “Palácio de Mannheim”
(“Mannheimer SchloB”).
“Palácio de Mannheim” (“Mannheimer SchloB”).
“Palácio de Mannheim” (“Mannheimer SchloB”). Aspeto dos danos no telhado.
“Palácio de Mannheim” (“Mannheimer SchloB”). Exemplo de uma sala de exposições original.
“Palácio de Mannheim” (“Mannheimer SchloB”). Aspeto dos danos no interior.
Este edifício, era o ponto aglutinador do centro urbano
de Mannheim, encerrando-o mas ou menos a Sul. A planta da cidade de Mannheim
parecia estar desenhada em função deste grande edifício barroco de corpo
central e duas alas perfeitamente simétricas. Era uma situação semelhante ao
que acontecia na cidade, também germânica, de Karlsruhe, cujo castelo era como
que o ponto de onde irradiava um semicírculo que era, por sua vez, a forma da
planta desta cidade. De referir que este castelo/palácio (o denominado "Badisches SchloB") arderia por completo em Setembro de 1944, na sequência de mais um bombardeamento sobre esta cidade.
Karlsruhe. Badisches SchloB (1912).
Karlsruhe. Badisches SchloB (1921).
Karlsruhe. Badisches SchloB (após 1944).
Karlsruhe. Exemplo da decoração original do "Badisches SchloB", antes de 1944.
Karlsruhe. O "Badisches SchloB" hoje.Livro essencial para se melhor compreender a história deste monumento incontornável do hoje estado Baden-Württemberg.
A cidade de Mannheim ainda seria atacada nos mesmos moldes durante alguns dias posteriores, com danos relativamente reduzidos. No entanto, a sua fácil localização acabaria, sobretudo a partir de 1943, por resultar num crescendo de áreas destruídas, a tal ponto que, no final da Guerra, quase não existisse um único edifício intacto no seu centro histórico.
Por
outro lado, havia o problema dos aviões não terem combustível suficiente quer
para se manterem em voo por um tempo mais alargado, quer para alcançarem alvos
mais distantes. Para além disto, a carga de bombas que eles transportavam, não
lhes permitiam provocar danos muito assinaláveis, mesmo quando se concentrassem
melhor num alvo específico. Os bombardeiros bimotores, desde logo, revelaram-se
“pouco ambiciosos” em matéria de potenciais resultados. Desta forma, num muito
curto espaço de tempo, surgiram projetos de novos aviões que suprissem as
limitações dos então existentes. Havia que também operar mudanças nas próprias
linhas de montagem das fábricas de aviões que então operadas. Desde logo,
desencadeou-se, em velocidade de contrarrelógio, toda uma concertada
reformulação dos recursos existentes, em solo britânico. Por outro lado,
sabia-se que, nas mesas de trabalho norte-americanas e nos seus hangares,
começavam a surgir protótipos de modelos de aviões quadrimotores, provando que
tais veículos eram perfeitamente concretizáveis. Desta forma, do lado britânico,
houve todo um trabalho e investimento de bastidores, inicialmente quase
desconhecido do público, mas que se revelaria vantajoso a longo prazo.
Do lado germânico, tal não
acontecia. Havia projetos de aeronaves maiores e com maior capacidade, mas os
poderes dominantes estavam plenamente confiantes nos modelos seguidos desde a
década anterior. Pensavam que o que existia “era suficiente”. Por outro lado, o
grosso do investimento estava a ser canalizado para a ofensiva, que se
pretendia rápida e breve nos resultados. O Comando Central alemão não concebia
uma guerra de longa duração. As conquistas estavam a ser surpreendentemente
rápidas. Zonas fortificadas que, até então, eram julgadas inexpugnáveis, caiam
com uma facilidade maior do que o esperado, quase tornando supérfluas, todas as
forças e recursos envolvidos, logo à partida, na sua neutralização e conquista.
Exemplo disto, havia sido a “Linha Maginot”, antes considerada um modelo a
seguir.
Esta sensação de rapidez e
facilidade que as forças germânicas haviam encontrado e, sobretudo, acumulação
de recursos aparentemente “em excesso” gerou, no lado germânico, a ideia de que
havia que ser “racional” e onde fosse possível, evitar “gastos supérfluos”. Daí
que nada havia sido feito, naquela fase decisiva, nada de crucial para se
alterarem os “planos” já existentes. Embora houvesse uma adicional
“predileção” por um certo “show off”, um bocado à maneira das grandes e
esmagadoras paradas militares, a que os serviços de propaganda do Reich, já
haviam habituado o Mundo. O filme da entrada vitoriosa das forças germânicas
numa Paris quase deserta e, sobretudo, um filme documentário, feito com recurso
a câmara de filmar portátil, efetuado de dentro de um carro descapotável, a
percorrer as ruas de Paris, sem quaisquer problemas, como que num autêntico
“passeio turístico”, eram disso exemplos mais paradigmáticos. Na mente dos
principais estrategas germânicos, havia a plena e crescente convicção de que os
“países a conquistar” se curvariam perante a chegada das tropas da “Wehrmacht”
ou mesmo, se tornariam, rapidamente, em aliados.
No seguimento disto, se era possível
fazer, abertamente, aquelas demonstrações de força em terra, então não havia
nenhum problema em copiá-las no ar, como se esperaria de uma “guerra moderna”.
O investimento e dedicação relativamente aos aviões Junkers 87, vulgarmente
conhecidos por “Stuka” era o culminar dessa atitude de, afinal, excessiva
autoconfiança.
O próprio chefe máximo da
“Luftwaffe”, a força aérea germânica, Hermann Göering, considerava mesmo
“completamente absurda” a ideia de a R.A.F. alguma vez “ousar” entrar no espaço
aéreo do “3º Reich”. O futuro demonstraria uma realidade completamente
diferente…
Ainda antes de Sir Arthur Harris assumir o seu lugar à frente do Comando de Bombardeiros, o perfil das incursões aéreas sobre o território germânico começava a assumir novas formas. Desde 1939, que se havia dado como adquirido que efetuar bombardeamentos diurnos sobre alvos precisos e visíveis, seria demasiado custoso em material e homens. Tal como aconteceria com a inimiga "Luftwaffe", da parte do Comando de Bombardeiros da R.A.F., as incursões aéreas passariam a ser, por regra, noturnas e pouco precisas, senão mesmo muito imprecisas. Os níveis de destruição conseguidos nos alvos eram muitas vezes mínimos, apesar de, com cada vez mais frequência se estarem a conseguir, aqui e ali, alguns sucessos de destaque.
A título de exemplo, logo em 10 de Julho de 1941, a
cidade de Aachen (Aix-La-Chapelle) é alvo do seu primeiro “grande bombardeamento” o qual,
analisado em retrospetiva, anunciava os moldes das futuras incursões aéreas
aliadas. A imagem é disso muito representativa.
A cidade de Aachen (Aix-La-Chapelle)em chamas, após o seu primeiro grande bombardeamento.
Aachen (Aix-La-Chapelle) no começo do séc. XX.
Aachen (Aix-La-Chapelle) por volta de 1920 - 1930.
Aachen (Aix-La-Chapelle) durante a Guerra.
Aachen (Aix-La-Chapelle) durante a Guerra.
Aachen (Aix-La-Chapelle)durante aGuerra.
Aachen (Aix-La-Chapelle) durante a "batalha pela cidade", em 1944. Nesse ano (1944), Aachen foi, a primeira cidade principal germânica a ser conquistada (ou "libertada") pelos Aliados. Quando as forças americanas iniciaram o cerco de Aachen, já esta cidade havia sido fortemente bombardeada, nos anos anteriores, pela aviação aliada, com destaque para os raids de 11 de Abril e 24 de Maio de 1944 os quais, segundo o historiador Jörg Friedrich, a haviam "radicalmente destruído".
Aachen (Aix-La-Chapelle)durante a "batalha pela cidade", em1944. Só após um curto período de combates violentos e encarniçados, durante o qual a luta decorreu verdadeiramente quase "casa a casa", como aconteceria noutras cidades germânicas, onde a ordem era "resistir até ao último homem", se conseguiu a rendição das tropas nazis que defendiam, fanaticamente, esta cidade que tem, ainda hoje, uma carga fortemente simbólica.
Aachen (Aix-La-Chapelle)durante a "batalha pela cidade", em1944.
Aachen (Aix-La-Chapelle)durante a "batalha pela cidade", em1944.
Aachen (Aix-La-Chapelle) após a rendição, em1944.
Aachen (Aix-La-Chapelle) após1944. Quando, após cessarem os combates, os americanos puderam percorrer a "Cidade de Carlos Magno", e tomaram plena consciência do seu grau de destruição, ficaram chocados... Uma das frases que mais circulava por aquela altura era verdadeiramente sintomática: "Se cada cidade a ser conquistada por nós estiver neste estado, os "Hunos" vão decerto levar séculos a reconstruírem-nas!".
Aachen (Aix-La-Chapelle) após1944.
Aachen (Aix-La-Chapelle) após1944.
Aachen (Aix-La-Chapelle) após1944.
Aachen (Aix-La-Chapelle) após1944.
Aachen (Aix-La-Chapelle) após1944.
Aachen (Aix-La-Chapelle) após1944.
Aachen (Aix-La-Chapelle) após1944.
Aachen (Aix-La-Chapelle) após1944.
Aachen (Aix-La-Chapelle) após1944. Imagem de uma "cidade morta".
Em retrospetiva, anos depois da
Guerra, em depoimentos na 1ª pessoa, fica-se a saber que já havia “vozes”,
dentro das principais esferas de influência do próprio partido nazi, a
aconselharem “prudência” e a não darem com definitivamente adquiridas as
“vitórias fáceis”, que eram festejadas nas ruas das principais cidades
germânicas, tal como o povo alemão tanto gostava… Os poderes centrais e,
consequentemente, os cidadãos comuns, não lhes davam ouvidos… Estas vozes de
inteligente prudência eram encarados como “desmancha-prazeres” e mesmo
“prejudiciais” para o moral das forças militares e dos civis germânicos. Um
deles, Hans Kehrl, havia afirmado numa entrevista feita, quando já era idoso:
“Eu conhecia bem os ingleses… Eu sabia que eles não iam ficar por ali!…”.
Sir Richard Peirse.
Sir Arthur Harris.
Por sua vez, na sequência de uma operação de bombardeamento sobre Berlim mal sucedida, empreendida em finais de 1941, e a necessidade de desviar forças para proteger os comboios marítimos aliados que estavam agora sob a ameaça constante dos submarinos germânicos ("U-Boat"), o Comando de Bombardeiros da R.A.F. esteve em vias de suspender as suas atividades. É na sequência desta conjuntura, que o, então, chefe máximo do Comando de Bombardeiros, Sir Richard Peirse, é afastado do seu cargo. Para o substituir é, logo no começo de 1942, escolhido Sir Arthur Harris.
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