segunda-feira, agosto 23, 2010

Fotógrafos ou fotografadores?

Nos tempos que correm, em que a imagem, quer no seu sentido restrito, quer no seu sentido mais alargado, se encontra muito democratizada, o acto de obter fotografias é um gesto perfeitamente espontâneo e automático.
Uma fotografia desperta sempre um rol de sensações no seu observador. Este poderá sentir espanto ao tomar o primeiro contacto com realidades que ignorava até então; alegria por poder relembrar o que já tinha esquecido; o choque perante uma imagem impressionante; saudade e nostalgia ao recordar um tempo que passou; prazer ao observar uma paisagem de rara beleza; curiosidade perante uma imagem algo enigmática. Isto só para referir alguns exemplos.
Uma máquina fotográfica tem sido um dos objectos mais cobiçados pelo comum dos mortais, pois permite reter o que não se pode guardar, combatendo a volatilidade do tempo. A fotografia é uma verdadeira janela para o passado, o qual pode ser, em parte, revivido no presente.
Apesar de todo o entusiasmo, que existe à volta deste hoje banal bem de consumo, tal no entanto não encontra correspondência no que respeita ao seu valor patrimonial. Há uma ansiedade em se conseguir sempre o último grito em máquinas fotográficas digitais, em programas de computador para trabalhar a imagem e mesmo impressoras que permitam a cada um conseguir fazer as suas fotos em casa. Já para não falar no muito cobiçado telemóvel de última geração que possa substituir a necessidade adicional de ter uma verdadeira máquina fotográfica.
Pode-se afirmar que há quem tire fotografias sem nunca ter tido a oportunidade de ter nas mãos uma verdadeira máquina fotográfica e o mesmo se pode aplicar à realização de filmes. O fenómeno do “YouTube” é bem a prova disso: muitos dos filmes que por lá se encontram resultam de captações de muito baixa resolução (para não falar da qualidade) feitas em simples telemóveis.
O Mundo está cheio de pretensos fotógrafos que se vangloriam de acumular, sem critério, sucessivas imagens, muitas delas versões diferentes de um mesmo motivo, graças aos cartões de memória multi-gigabaitescos, que, apesar de tudo, permitiram acabar com o pesadelo limitativo do “fim-do-rolo”. Mas, na realidade, pouco ou nada sabem do que é, de facto, fazer fotografia. É verdade, reconheça-se, que a grande maioria do dito público fotografador, não tem interesse em saber sequer os meros rudimentos da arte de bem fotografar. Desde que tenham um simples gadget onde possam captar, ver e, porque não, enviar a outros fotografias virtuais, nada mais lhes interessa, para além de ter o cartão de memória com maior capacidade de armazenamento.
Há depois aqueles, sempre em minoria, a quem interessa, de facto, “fazer” fotografia e elevarem-se acima daqueles que captam imagens como quem escreve mensagens telegráficas de telemóvel. Este livro vem, precisamente, ao encontro destes. Nunca é demais relembrar que, para além do que já foi dito, existe um desinteresse quase total, da parte do público em geral, relativamente a tudo o que diga respeito às técnicas fotográficas mais antigas, quer no que respeita às fotos em si, quer no que respeita aos utensílios fotográficos. Tudo o que é antigo neste campo é visto exactamente como obsoleto e dispensável. Muita gente só preserva em casa fotografias antigas, devido mais às memórias de pessoas e lugares que, directa ou indirectamente, lhes sejam familiares.
A fotografia, como um mensageiro das imagens e das memórias do passado é, exactamente por isso um documento vivo. Através da sua imagem, vê-se o que já não se pode voltar a ver. Mas a fotografia, é muito mais do que uma imagem parada no tempo.
A ideia de que a fotografia, mais do que captar imagens do real, também acaba por ser uma nova perspectiva desse mesmo real, acaba por ser uma das ideias-chave desta obra, ao fazer lembrar aos leitores o muito que existe para lá da realidade quotidiana, feita de meros automatismos simplistas, a que se encontra reduzida a grande maioria dos fotógrafos de ocasião que pululam à nossa volta.